Aposentadoria compulsória de juízes custa R$ 41 milhões ao ano
Mesmo afastados por infrações graves como venda de sentenças e assédio, magistrados seguem recebendo proventos proporcionais ao tempo de serviço
247 - Apesar de afastados de forma definitiva por infrações disciplinares, juízes punidos com aposentadoria compulsória continuam a gerar impacto significativo nos cofres públicos. Segundo levantamento do jornal O Globo, com base em dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e de tribunais estaduais e federais, 119 magistrados foram aposentados compulsoriamente desde 2008, e ainda assim custam cerca de R$ 41 milhões por ano ao erário.
A chamada aposentadoria compulsória é a sanção máxima prevista pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) para condutas irregulares de magistrados. Ainda que implique o desligamento definitivo das funções jurisdicionais, a punição não interrompe o pagamento de proventos — os valores continuam sendo depositados mensalmente, proporcionais ao tempo de contribuição do magistrado, respeitando o teto da magistratura, atualmente fixado em R$ 39,2 mil.
Como funciona o cálculo - O valor a ser pago é determinado com base em uma fórmula: o tempo de contribuição do magistrado é dividido pelo mínimo exigido de 30 anos e multiplicado pelo valor máximo da remuneração. Os magistrados afastados, contudo, perdem o direito a gratificações e adicionais, como auxílio-moradia e verbas indenizatórias.
O caso mais recente é o do juiz federal Marcelo Bretas, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), ex-responsável pela Lava Jato no Rio de Janeiro. Após 28 anos de serviço, ele passará a receber R$ 36,7 mil mensais. A média geral entre os aposentados compulsoriamente é de 21 anos e cinco meses de tempo de contribuição, o que equivale a um benefício médio de R$ 28,5 mil mensais. Há casos em que o valor mensal chega a R$ 15 mil, em carreiras interrompidas ainda no início, ou se aproxima do teto quando o afastamento ocorre próximo da aposentadoria voluntária.
Infrações que motivaram as punições - As faltas cometidas pelos magistrados punidos são variadas, mas todas graves: nepotismo, abuso de autoridade, improbidade administrativa, assédio sexual e até mesmo venda de sentenças estão entre as irregularidades apuradas.
Em 2024, os juízes Carlos Madeira Abad (TJ-ES) e Ather Aguiar (TJ-MG) foram aposentados após denúncias de assédio sexual a servidoras. Já a juíza Ludmila Lins Grilo foi punida por criticar abertamente ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem se referiu em redes sociais como “perseguidores gerais da República do Brasil”.
Dois outros casos emblemáticos ocorreram em 2025: o juiz Ronaldo João Roth foi punido pela Justiça Militar de São Paulo por coagir réus a falarem em interrogatório, violando o direito ao silêncio. Já o juiz Carlos de Souza (TJ-RJ) foi afastado após ter sido flagrado furtando uma peça sacra durante viagem a Tiradentes (MG) — o episódio aconteceu em 2014, mas a punição foi aplicada apenas neste ano.
Debate jurídico sobre a penalidade - O pagamento de remuneração a juízes que cometeram infrações disciplinares provoca controvérsia entre especialistas em direito. Para alguns, a aposentadoria compulsória, por não implicar perda total dos rendimentos, equivale a um benefício disfarçado.
“O Brasil enfrenta enormes desafios socioeconômicos, e é quase imoral que recursos públicos sustentem pessoas afastadas por má conduta. A aposentadoria compulsória, na prática, soa mais como um prêmio do que como punição”, afirma Fernando Bentes, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).
Já o professor Thiago Varela, da PUC-RJ, ressalta que a perda definitiva do cargo só pode ser determinada por sentença judicial transitada em julgado, o que assegura a autonomia da magistratura: “em muitos casos, o magistrado afastado com pouco tempo de serviço recebe valores bastante reduzidos”.
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