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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor de “Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil”. https://noticiariocomentado.com/

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Tributar milionários e desonerar pobres é keynesiano, não marxista

Os reacionários brasileiros ignoram que o tema da justiça tributária não consta da teoria da luta de classes marxista

Jerônimo Rodrigues, Lula e Janja (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

A gritaria da mídia, em sintonia com a maioria de um Congresso reacionário até a medula, aponta o discurso “nós contra eles” do governo. Lula estaria revivendo a luta de classes marxista para alavancar sua popularidade – pobres versus ricos, trabalhadores versus patrões –, em vez de aceitar candidamente que o melhor para o Brasil é mesmo cortar gastos sociais e jamais aumentar impostos da turma da bufunfa. Não importa se as elites financeiras pagam muito menos impostos que as faixas inferiores da pirâmide social.

Os reacionários brasileiros ignoram que o tema da justiça tributária não consta da teoria da luta de classes marxista. Não é “coisa de comunista”. Marx apenas admitia que os trabalhadores lutassem por impostos progressivos enquanto não conseguissem abolir as relações capitalistas de trabalho. Contundente nessa área foi John Maynard Keynes, que, além de capitalista, nutria por Marx notória implicância.

Keynes defendeu com veemência a taxação progressiva sobre os ricos como forma de redistribuição e estímulo à economia. Advogou pela desoneração dos pobres e da classe média como meio de aumentar o consumo e o bem-estar.

Assim escreveu o ilustre economista britânico, no seu How to Pay for the War, de 1940: “Não é sensato manter um padrão de vida de luxo para os ricos ao mesmo tempo em que pedimos aos pobres que façam sacrifícios. Os ricos devem ser tributados pesadamente, não apenas para financiar a guerra, mas para manter a justiça social e evitar um excesso de poupança improdutiva, que apenas agrava os problemas econômicos. A função dos impostos é dupla: arrecadar e redistribuir. A justiça exige que o peso recaia mais sobre aqueles que podem poupar e menos sobre os que vivem de sua renda mensal”.

A obra foi escrita e publicada num cenário de guerra mundial, mas Keynes deixou claro que a justiça tributária deveria fazer parte a qualquer tempo das economias saudáveis. A lógica, para o mais importante economista do século XX, deveria ser a adaptação do sistema tributário para regular a economia. Ou seja: mais impostos sobre quem possui mais capacidade de poupança e menos impostos para quem movimenta o consumo. Já em 1919, no clássico The Economic Consequences of the Peace, Keynes demonstrava preocupação ética e econômica com a concentração de riqueza, para ele uma fonte de instabilidade social e política.

Nos tempos atuais, ninguém trata melhor do tema tributação que o economista francês Thomas Piketty, autor de O Capital no Século XXI, que já nasceu clássico em 2013. Numa entrevista à Veja, ele sentenciou: “Quem fica milionário se beneficiou do sistema educacional e da infraestrutura de seu país e lhe deve retribuição”. Bingo.

Na DTM em Debate, Piketty foi claro e enfático: “O que defendo não é apenas um imposto qualquer, mas um imposto progressivo sobre o capital. (...) Um imposto sobre o capital privado é crucial para combater as crescentes desigualdades, mas também seria um instrumento útil para resolver crises da dívida pública, com contribuições de cada um segundo sua riqueza”.

Caracterizar a busca do governo Lula por justiça tributária como fomento à luta de classes é o recurso retórico dos donos das armas, os históricos donos do dinheiro e do poder. No Brasil, os pobres são subjugados e restam desarmados. Quando um governo se elege para redimi-los, ataca-se o governo.

Não existe luta de classes no Brasil. Existe a sujeição de uma classe a outra. Reverter em parte essa realidade por meios tributários seria um bom começo.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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