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Julimar Roberto

Comerciário e presidente da Contracs-CUT

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O preço da democracia sequestrada

Se os parlamentares continuarem operando como um poder autônomo voltado para seus próprios interesses, continuarão servindo de obstáculo ao desenvolvimento

Esplanada dos Ministérios, com o Congresso Nacional ao fundo, em Brasília - 07/04/2010 (Foto: REUTERS/Ricardo Moraes)

O Brasil vive uma distorção perigosa entre os poderes da República. O Congresso Nacional, que deveria se limitar à tarefa de legislar em nome da coletividade, tem avançado sobre as atribuições do Executivo e se consolidado como um poder paralelo — dominado por interesses próprios, barganhas de bastidores e manobras que colocam o Governo Federal em xeque. O que se vê, na prática, é um Parlamento que interfere diretamente na condução das políticas públicas, impondo sua pauta particular e inviabilizando decisões estratégicas, especialmente aquelas voltadas aos mais pobres.

Exemplo disso foi a recente derrubada de vetos presidenciais que tentavam conter danos fiscais e sociais provocados por jabutis legislativos. Em vez de apoiar medidas que buscavam aliviar o peso da desigualdade — como a taxação de super-ricos e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais — o Congresso preferiu defender seus próprios privilégios. Ignorou a vontade popular, desprezou a justiça tributária e demonstrou, mais uma vez, que o projeto de país que o move não é o da maioria trabalhadora, mas o das elites e de seus próprios currais eleitorais.

Ao interferir no decreto que elevava o IOF sobre fundos exclusivos e offshore, o Poder Legislativo não apenas enfraqueceu a arrecadação, mas atacou diretamente uma das poucas iniciativas concretas de tributação sobre os muito ricos. E o fez com desenvoltura, escancarando que não há compromisso com a construção de um sistema mais justo — apenas com o jogo de interesses que se sustenta por emendas bilionárias, acordos informais e chantagens institucionais.

Não bastasse o estrangulamento das pautas sociais, deputados e senadores seguem criando despesas irresponsáveis, como a aprovação da criação de mais cadeiras na Câmara Federal — medida que vai gerar um gasto anual de mais de R$ 65 milhões com salários e verbas de gabinete. Aumentam o tamanho da máquina pública sem nenhum compromisso com a eficiência ou com o retorno para a sociedade. Quando o presidente Lula, corretamente, ameaçou vetar essa ampliação, os próprios parlamentares responderam com retaliação política e novos entraves à governabilidade.

Diante de tantos ataques, o governo se viu obrigado a recorrer ao Supremo Tribunal Federal para tentar garantir sua própria capacidade de governar. Trata-se de uma inversão total da lógica democrática ao vermos o Executivo, eleito com mais de 60 milhões de votos, tendo que buscar proteção contra a sabotagem do Parlamento. E o mais grave é que essa desestabilização não parte de uma oposição coerente com um projeto alternativo de país — ela é feita, em larga medida, pela base congressual que se diz aliada, mas que atua como operadora de interesses corporativos, de lobbies e da manutenção de privilégios.

É urgente recolocar o Congresso em seu devido lugar. Legislar não é governar. Fiscalizar não é obstruir. A construção de políticas públicas é tarefa do Executivo, e é papel do Legislativo aperfeiçoá-las, não sabotá-las. O país não pode continuar sendo refém de um Poder eleito pelo voto popular que, ao invés de representar quem o elegeu – o povo -, age como balcão de negócios. O Brasil precisa de reformas — política, tributária, social — e todas elas passam pela recuperação do espírito público no Parlamento.

Se os parlamentares continuarem operando como um poder autônomo voltado para seus próprios interesses, continuarão servindo de obstáculo ao desenvolvimento nacional. O que está em jogo é a soberania popular e a capacidade do Governo Federal responder às demandas urgentes da população. Lula foi eleito para governar, e não para ficar refém da autorização de deputados e senadores que transformaram a política em moeda de troca. O país precisa avançar — e, para isso, o Congresso precisa recuar.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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