Corte Interamericana reconhece dever dos Estados no combate à crise climática
Parecer da Corte IDH reforça dever dos países de conter emissões, combater greenwashing e adotar metas climáticas ambiciosas com base científica
247 - A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) afirmou, em parecer divulgado nesta quinta-feira (3), que os Estados da América Latina e do Caribe têm a obrigação de adotar medidas concretas e cooperativas para enfrentar a crise climática.
Apesar de não ser juridicamente vinculante, o parecer representa uma interpretação oficial das obrigações dos Estados à luz da Convenção Americana de Direitos Humanos. De acordo com a Corte, os países não apenas devem evitar ações que comprometam a proteção ambiental, mas também precisam implementar políticas efetivas de mitigação, adaptação e cooperação além de suas fronteiras.
Dever estatal e regulação das corporações
A Corte foi clara ao afirmar que os Estados devem regular, fiscalizar e, se necessário, sancionar empresas que emitam gases de efeito estufa, principal causa do aquecimento global. Além disso, recomendou que os países desencorajem o “greenwashing” — prática de marketing enganosa sobre suposta sustentabilidade — e combatam a interferência corporativa indevida nas decisões políticas e regulatórias sobre o clima.
“Os governos devem estabelecer metas vinculativas de redução de emissões, o mais ambiciosas possível, com prazos definidos e baseadas no melhor conhecimento científico disponível”, determinou o parecer. As metas devem refletir a responsabilidade histórica de cada país na emissão de poluentes e considerar a justiça intergeracional.
Clima e direitos humanos: um vínculo inegociável
A diretora jurídica da ONG Oil Change International, Maria Alejandra Vesga Correa, destacou o alcance político e jurídico do documento: “Pareceres consultivos fornecem interpretações oficiais das obrigações vinculantes dos Estados em matéria de direitos humanos sob a Convenção Americana de Direitos Humanos e outros tratados”, explicou. E acrescentou: “Este é um alerta para governos, indústrias de combustíveis fósseis e instituições financeiras. A era da impunidade para danos climáticos e ambientais está chegando ao fim”.
O julgamento reforça a tendência internacional de reconhecer que a omissão diante da crise ambiental configura uma violação de direitos humanos. Em 2023, por exemplo, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos considerou que a inação climática dos governos infringe garantias fundamentais. Na Coreia do Sul, a corte constitucional avaliou que a legislação ambiental vigente falha em proteger adequadamente as gerações futuras.
Participação inédita e foco na COP30
A redação do parecer da Corte IDH foi resultado de um processo de consulta amplo e inédito: mais de 260 observações por escrito foram enviadas por entidades e especialistas, e 180 delegações participaram das audiências públicas realizadas em Barbados e também no Brasil — em Brasília e Manaus.
A advogada e ex-ministra do Meio Ambiente da Argentina, Romina Picolotti, atualmente fundadora do Center for Human Rights and the Environment, reforçou o peso do parecer na preparação da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), marcada para este ano na Amazônia: “Os Estados nacionais, que têm o poder de conduzir políticas de mitigação e adaptação e que este ano estarão reunidos na Amazônia na COP30, têm o dever de defender os direitos de seus cidadãos. O parecer da Corte IDH não é apenas uma salvaguarda para litigantes: é um poderoso recado aos negociadores para que lutem pelos direitos de seus povos”, afirmou.
Caminho aberto para ações judiciais
O tribunal interamericano também reconheceu o litígio climático como uma ferramenta essencial no atual contexto de emergência global. “É um campo emergente, mas cada vez mais crucial para responsabilizar Estados e empresas”, destacou o texto.
A crescente judicialização da questão ambiental, com processos em cortes nacionais e internacionais, demonstra que o discurso científico sobre a crise climática já não é suficiente: há uma pressão jurídica e social crescente por medidas concretas, transparentes e eficazes.
Com esse parecer, a Corte IDH estabelece um marco na América Latina e no Caribe, conectando a proteção ambiental ao respeito aos direitos humanos e dando novo fôlego à luta contra a crise climática em um continente historicamente vulnerável e desigual.
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com [email protected].
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: