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Com terras raras, Brasil tem oportunidade histórica de ocupar o centro da geopolítica

Reservas de lítio, nióbio e terras raras colocam o país em posição estratégica na transição energética global, mas é preciso acelerar

Minério bruto de terras raras (Foto: REUTERS/Nayan Sthankiya)
Guilherme Levorato avatar
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247 - A transição global rumo a uma matriz energética mais limpa está redesenhando o tabuleiro geopolítico internacional. No lugar do antigo protagonismo do petróleo e do gás natural, agora ganham relevância os minerais críticos — como o lítio, o nióbio e as terras raras —, fundamentais para tecnologias de baixo carbono. É nesse novo cenário que o Brasil começa a se destacar, com potencial para se tornar uma das principais fontes desses insumos estratégicos.

De acordo com reportagem do jornal O Globo, o país concentra algumas das maiores reservas do mundo, especialmente de lítio e terras raras — essenciais para baterias de veículos elétricos, turbinas eólicas, painéis solares e componentes eletrônicos de alta tecnologia. Mas o desafio é compatibilizar a expansão da produção com o compromisso ambiental e o desenvolvimento industrial de longo prazo.

Brasil em posição privilegiada, mas sob desafios ambientais - “O Brasil pode ter uma posição geopolítica muito mais relevante do que tinha com o processo de transição energética”, avalia Marcio Couto, superintendente de pesquisa da FGV Energia. “Tem grande estoque de minerais críticos, potencial para se tornar grande fornecedor, mas é preciso observar como as questões ambientais serão endereçadas. Nem todo o potencial do país poderá ser explorado”.

Atualmente, o Brasil possui a segunda maior reserva de terras raras do planeta, ficando atrás apenas da China. Minas Gerais lidera a corrida interna com investimentos já superiores a R$ 5 bilhões. No caso do lítio, os aportes previstos até 2030 somam cerca de R$ 15 bilhões, segundo o Ministério de Minas e Energia (MME). O Vale do Jequitinhonha desponta como epicentro da produção nacional. Já em relação ao nióbio — empregado em supercondutores e baterias — o Brasil responde por mais de 90% das reservas mundiais conhecidas.

Recursos estratégicos exigem capacidade de refino e valor agregado - Valdir Silveira, diretor de Geologia e Recursos Minerais do Serviço Geológico do Brasil (SGB), ressalta que a concentração desses recursos em poucos países pode criar gargalos na cadeia de suprimentos. “A transição energética elevou esses minerais ao status de ‘recursos estratégicos críticos’, comparáveis ao petróleo no século XX. Portanto, países que detêm reservas significativas, como o Brasil, mas também capacidade de produção ou, principalmente, capacidade de refino e processamento (onde a China domina e tem grande vantagem atualmente), inevitavelmente estão no centro de atenção de poder geopolítico”.

Já o sócio da KPMG no setor de Energia e Recursos Naturais, Manuel Fernandes, reforça que o país precisa decidir seu papel: exportador de matérias-primas ou produtor de bens de maior valor agregado. “São projetos muito relevantes do ponto de vista do investimento em infraestrutura. Para fazer uma mina tradicional, com a logística para chegar no ponto de embarque, são de três a cinco anos. E construir uma refinaria para esses minerais críticos leva de três a quatro anos. Então, não é um projeto para curtíssimo prazo”, explicou.

Segundo ele, a inovação também será essencial. Fernandes observa que, embora a China concentre 70% da produção mundial de terras raras, está investindo fortemente em fontes renováveis de energia para atender sua demanda crescente. No Brasil, por outro lado, a participação na oferta global ainda é inferior a 1%.

Novo cinturão industrial solar e oportunidades globais - Um relatório recente da Mission Possible Partnership (MPP) identifica uma nova tendência que pode favorecer países em desenvolvimento. Segundo o documento, Índia, Egito e Brasil compõem o chamado “cinturão industrial solar” — uma faixa geográfica onde abundância de recursos naturais favorece a produção de energia solar e o surgimento de uma nova base industrial limpa.

O estudo destaca que a China ainda lidera os investimentos em indústrias limpas, com 25% dos US$ 250 bilhões aplicados globalmente, seguida pelos Estados Unidos (20%) e União Europeia (15%). Contudo, o cinturão solar já atrai 20% dos aportes e é responsável por 59% dos projetos anunciados — embora ainda não financiados — em setores como alumínio, cimento, aço, aviação e produtos químicos.

"Assim como as indústrias do passado se localizavam perto das minas de carvão, a nova geração de plantas industriais intensivas em energia irá para onde puderem ter acesso a eletricidade abundante, confiável, barata e limpa para produzir materiais, produtos químicos e combustíveis”, afirmou Faustine Delasalle, CEO da MPP e diretora do Acelerador de Transição Industrial (ITA), lançado na COP28.

Caminho depende de decisão política e investimento coordenado - Apesar do enorme potencial, o relatório da MPP alerta que o ritmo de concretização dos projetos é lento. Caso a taxa de conversão dos últimos seis meses se mantenha, seriam necessários 40 anos para que todos os empreendimentos saiam do papel. A solução exige um salto de cinco vezes no nível atual de investimentos, com engajamento de governos, instituições financeiras e empresas.

No caso brasileiro, além de preservar o meio ambiente, o desafio será alinhar estratégias públicas e privadas para transformar sua vantagem mineral em desenvolvimento econômico sustentável. Uma política industrial robusta, voltada à agregação de valor e à autonomia tecnológica, poderá ser o diferencial para o país aproveitar plenamente a oportunidade histórica que se desenha com a nova geopolítica da energia.

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