Itaipu leva energia solar à Ilha da Trindade e reduz uso de diesel em território estratégico

247 - A Ilha da Trindade, ponto habitado mais isolado do Brasil e marco da presença nacional no Atlântico Sul, passou a contar com um sistema híbrido de geração de energia elétrica a partir de fontes renováveis. A iniciativa, que integra o programa Itaipu Mais que Energia, substitui os tradicionais geradores a diesel por painéis fotovoltaicos e baterias de lítio, garantindo fornecimento contínuo de energia com menor impacto ambiental. A informação é da Agência Brasil.

Localizada a 1.160 quilômetros da costa do Espírito Santo, a ilha é considerada uma das áreas mais estratégicas e ambientalmente sensíveis do país. A instalação do novo sistema, que entrou em operação no fim de maio, representa um avanço concreto na transição energética brasileira. Em seu primeiro mês de funcionamento, o gerador a diesel foi acionado por menos de 2% do tempo, evidenciando a eficácia do novo modelo.

Com investimento de R$ 6,8 milhões, o projeto é resultado de um convênio entre a Itaipu Binacional, a Itaipu Parquetec e a Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (SECIRM), vinculada à Marinha do Brasil. A logística envolveu o transporte de 50 toneladas de equipamentos a bordo do navio NDCC Almirante Saboia e o apoio de um helicóptero H225M para o içamento dos materiais até a ilha.

Soberania energética e proteção ambiental

A nova usina conta com 480 painéis solares (264 kWp), uma central de 200 kW, 48 baterias de lítio (com capacidade de 645 kWh) e um gerador a diesel de backup. O objetivo é reduzir em até 90% o consumo anual de óleo diesel — de 60 mil para 6 mil litros — e eliminar a necessidade de transporte frequente do combustível por longas viagens marítimas.

Segundo o diretor-geral brasileiro da Itaipu Binacional, Enio Verri, o projeto vai além da economia de energia. “Trindade faz parte da Amazônia Azul e cumpre um papel relevante na proteção territorial e no avanço das pesquisas científicas”, afirmou. “Reduzir o uso de combustível fóssil nesse território é uma contribuição concreta da Itaipu no contexto da transição energética. A iniciativa, assim como o projeto de Tunuí-Cachoeira, na Amazônia Legal, pode servir de modelo para outras regiões remotas do país.”

A Marinha mantém presença constante na ilha, o que garante ao Brasil o direito de exploração econômica da Zona Econômica Exclusiva (ZEE) num raio de 370 quilômetros. A instalação da usina reforça essa posição estratégica e melhora a infraestrutura do Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade (POIT), onde atuam 36 militares e pesquisadores.

Logística complexa e impacto sustentável

A operação envolveu 61 manobras aéreas verticais (VERTREPs) e 38 pousos diretos, além da remoção de 10 toneladas de resíduos acumulados na ilha. O capitão de mar e guerra Allan de Almeida Nunes, comandante do navio Almirante Saboia, destacou o papel essencial da aeronave de grande porte na missão. “Essa remoção só foi possível com o uso de um helicóptero desse porte. A aeronave transportou inclusive um trator, essencial para as atividades logísticas em terra”, explicou.

O superintendente de Energias Renováveis da Itaipu, Rogério Meneghetti, ressaltou a robustez e a autonomia do sistema implantado. “O excedente de energia é armazenado e utilizado à noite ou em dias nublados. Em casos excepcionais, o gerador entra em funcionamento para preservar a integridade do sistema.” Segundo ele, a capacidade instalada equivale ao consumo médio de cerca de 200 residências.

Eficiência energética e apoio à ciência

Além da geração de energia limpa, o projeto contempla ações de eficiência energética, como a troca de chuveiros elétricos por aquecedores solares, substituição da iluminação por LED e automação dos sistemas internos da ilha. Para o capitão de mar e guerra Rogério Rezende de Souza, a parceria com a Itaipu amplia as possibilidades operacionais com menor impacto ambiental. “A parceria com Itaipu amplia a capacidade de permanência da equipe na ilha com menor impacto ambiental e maior eficiência no uso dos recursos energéticos.”

A ilha abriga ainda a Estação Científica da Ilha da Trindade (ECIT), pela qual já passaram mais de 1,5 mil pesquisadores. Para o oceanógrafo Guilherme Dutra, do Instituto Trindade, a mudança representa um passo decisivo. “A ilha está entre as últimas grandes áreas remotas do Atlântico Sul ainda preservadas. Reduzir os impactos é essencial para garantir a continuidade das pesquisas.”

Biodiversidade e pesquisa de ponta

A Ilha da Trindade é o principal local de desova da tartaruga-verde no Brasil e o segundo da América do Sul. Também é habitat de espécies endêmicas, como o caranguejo “John”, e vegetações raras, como florestas de samambaias gigantes. O pesquisador Fernando da Silva de Oliveira, doutor em biotecnologia, enxerga na biodiversidade local um enorme potencial científico. “Espécies endêmicas podem produzir compostos inéditos, com potencial para novos medicamentos. A conservação do ambiente é fundamental para a pesquisa científica.”

Histórico e futuro

As tratativas para o projeto começaram em 2016, com a assinatura de um protocolo de intenções entre Itaipu, Itaipu Parquetec e SECIRM. Em 2017, foi feito o levantamento técnico da demanda energética da ilha. O convênio prevê ainda intercâmbio em áreas estratégicas como segurança cibernética, comunicações e desenvolvimento tecnológico.

Com a entrada em operação do sistema fotovoltaico da Ilha da Trindade, o Brasil fortalece sua presença em um território remoto e reafirma o compromisso com a transição energética e a proteção da biodiversidade — pilares essenciais para o futuro sustentável do país.