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César Fonseca

Repórter de política e economia, editor do site Independência Sul Americana

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Novo golpe de 1964 à vista

Avança a articulação entre trumpismo, bolsonarismo e Centrão para desestabilizar Lula e reinstalar a agenda neoliberal no país

Brasília (DF), 01/07/2025 - Fernando Haddad e Luiz Inácio Lula da Silva participam do lançamento do Plano Safra 2025/26, no Palácio do Planalto (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Claro como o sol.

Estão em franca evolução as articulações do império trumpista para derrubar Lula e operar uma mudança de governo.

Trata-se de aparelhar o Centrão e sua conjugação mais efetiva com o bolsonarismo, como aconteceu em 2018.

A direita — os diversos partidos que formam o Centrão — e a ultradireita fascista — o bolsonarismo —, com apoio total do trumpismo, estão adestradas por Washington para dar o golpe.

Os capitalistas americanos, que manipulam o Congresso brasileiro conservador para operar a desregulamentação neoliberal econômica radical, vão, com seus sócios menores no Brasil — vendilhões da pátria —, acelerar o processo de derrubada de Lula.

Isso já está acontecendo por meio do semipresidencialismo inconstitucional contra o presidencialismo constitucional.

A fatura que anima os golpistas no Congresso, claro, é o dinheiro das emendas parlamentares no montante de mais de R$ 50 bilhões, contestadas apenas, aparentemente, pelo Supremo Tribunal Federal, sem medidas efetivas de retaliação legal pelos juízes da suprema corte.

Mobilização popular, a saída - O que impediria essa manobra trumpista, com a colaboração de seus sócios internos, descompromissados com o interesse nacional, seria a mobilização popular.

Mas a população, para agir, precisa de decisões populares, pelo governo, para fortalecer políticas distributivas de renda.

Especialmente, faz-se necessária uma política social com aumento dos salários.

Afinal, se Trump vai barrar exportações brasileiras aos Estados Unidos, quem vai consumir esse excedente exportável no mercado, senão a população brasileira, desde que tenha dinheiro no bolso para consumi-lo?

A política salarial distributiva de renda que Lula colocou em prática — e que foi destruída pelos golpistas neoliberais — precisa ser restituída rapidamente.

Se o excedente interno não exportável não for absorvido pelo consumo interno, as empresas, sem consumidores — internos e externos —, vão fechar as portas.

Portanto, a alternativa para combater o desemprego forçado por Trump é valorizar novamente os salários, reajustando-os pela inflação, mais compensação real decorrente do crescimento do PIB nos dois anos anteriores.

Sem esse triunfo popular, que Lula ergueu no comando do poder nos seus dois primeiros mandatos, os capitalistas acabam cooptando a classe média e os proletários com discurso populista, sem conteúdo popular progressista.

Os neoliberais destruíram essa regra salarial lulista, que sustentava a demanda interna, e retornaram ao salário correspondente à produtividade marginal neoclássica do século XIX, sem complemento algum, o que provoca desemprego voluntário.

Ninguém vai trabalhar com salário dado pela produtividade marginal, em que, praticamente, paga-se para trabalhar.

Nesse caso, os miseráveis preferem entrar na fila do programa Bolsa Família, recebendo sem sair de casa.

Romper com o arcabouço fiscal neoliberal - As circunstâncias mudaram com o trumpismo protecionista radical, fato evidente que obriga o governo Lula a se adaptar a essas novas condições impostas pela agressividade neoliberal, para não cair.

Fica, então, cristalino que, se o governo quiser evitar o desemprego provocado pela estratégia golpista à la 1964 de Trump, terá que elevar os salários para combater o produto excedente não exportável em decorrência das tarifas trumpistas.

O garrote trumpista, que acelera a destruição das empresas exportadoras e o desemprego voluntário, com sucateamento salarial, empurra a economia para um neocolonialismo.

Industrialização, adeus - Inviabiliza-se completamente a industrialização, porque os empresários não continuarão produzindo, no cenário do garrote protecionista trumpista, se não houver consumidor externo, já que o interno está limitado pela insuficiência dada pelo salário remunerado apenas pela produtividade marginal, sem reajuste real.

Ademais, as empresas que exportam o grosso da produção brasileira, ligadas especialmente aos produtos primários e semielaborados — livres de impostos pela Lei Kandir —, poderão migrar para outros países, a fim de fugir da taxação de Trump, sabendo que elas não são brasileiras, mas multinacionais.

Trump já deu a dica para quem quer continuar exportando para os Estados Unidos, sem sofrer tarifas: que levem seus negócios para os Estados Unidos, pois lá não serão taxados.

Ou seja, Trump, com as tarifas, objetiva transportar, da periferia capitalista brasileira para o capitalismo cêntrico, as empresas americanas ou a elas associadas que, no passado, vieram cá.

Eis o que Trump quer: sucatear o capitalismo periférico.

Sucateamento periférico - Por isso, se se quer evitar que isso aconteça, tem que ser rompido o arcabouço neoliberal, cuja essência é atacar os salários que teriam o poder de consumir a produção interna, se fossem valorizados — até o golpe neoliberal de 2016, que veio para destruí-los.

Com o tarifaço trumpista, o governo Lula, portanto, tem que mudar a política econômica: sair do neoliberalismo restritivo que favorece a expansão da especulação e o encolhimento da produção, para promover o contrário: expansão dos gastos sociais, fortalecimento do mercado interno e esvaziamento da especulação, de modo a reduzir os juros e fortalecer a produção com mais investimentos.

O aumento dos gastos públicos, que significará expansão da oferta de moeda na circulação, como variável econômica independente, promovida pela autoridade monetária, produzirá:

  1. Redução dos juros;
  2. Elevação relativa dos preços pelo aumento da demanda em relação à oferta;
  3. Redução relativa da unidade de salário, pelo maior volume de contratação de mão de obra para compensar o aumento da oferta frente à demanda; e
  4. Perdão da dívida contratada a prazo — tanto a dívida pública como a dívida privada.

Dessa forma, pela conjugação automática desses quatro fatores em resposta ao aumento da quantidade de dinheiro em circulação (que é o que Trump acaba de fazer nos Estados Unidos), rompido o arcabouço fiscal, haverá aumento da eficiência marginal do capital (lucro), com possibilidade de remuneração maior dos salários para além da produtividade marginal, a fim de aumentar o poder de compra dos consumidores.

Abaixo o tripé neoliberal - O trumpismo protecionista impõe a necessidade da mudança do tripé neoliberal, imposto pelo Consenso de Washington, em vigor desde os anos 1990, com FHC.

Do contrário, o aumento do desemprego, por conta da desmontagem do modelo exportador — acelerado agora por Trump, para punir a aproximação de Lula ao BRICS, levando de roldão toda a América Latina a se descolar dos Estados Unidos e a se juntar à China — vai criar um ambiente de aguda crise social.

Lula estará diante do desafio de caminhar à frente do movimento social, para tentar comandá-lo, ou ser engolido por ele, se não mudar os rumos da política econômica neoliberal, agravada com o golpe de Estado que representam as medidas tarifárias trumpistas, evidenciando um novo movimento de 1964 contra a democracia brasileira.

A mobilização popular, que Lula está sendo convocado pela história a capitanear, não se fará apenas com discurso.

Do contrário, um novo 1964 vem aí, como programam Trump, bolsonaristas e Centrão.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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