Ednardo: Papel, Pele & Pulso

Terça-feira, 15 de abril, 18h. Enquanto aprecio a pressa da cidade, parado no cruzamento da Avenida Dom Manoel com a Avenida Presidente Castelo Branco, escuto, vindo da igreja do Seminário da Prainha, um cântico entoado pelos fiéis invadir o ar e reverberar nas paredes do Teatro São José, que dormita na escuridão da praça sob a proteção do Cristo Redentor. A alguns metros dali, em outro espaço não menos sagrado da cidade de Fortaleza, a Biblioteca Pública Estadual do Ceará - BECE (como seria lindo se ela fosse rebatizada como Biblioteca Prof. Gilmar de Carvalho!), o cantor Ednardo recebe amigos e admiradores para o lançamento da sua biografia intitulada Ednardo: Papel, Pele & Pulso (2025), publicada por Aura Edições Musicais. Finalmente chego. Na correria, quase esbarro na amiga Natália Veloso, que desde os tempos do Colégio Marista Cearense não encontrava. Pausa para uma selfie. Que alegria, Natália! Corro. Entro.

Na terra é pleno abril. Ednardo está visivelmente feliz. E se Ednardo está feliz, todos nós também estamos felizes. E percebo que o verso “abril é o mais cruel dos meses”, de T. S Eliot, não encontra abrigo ali, pois é também em abril, dia 17, que Ednardo completa 80 anos. Chego por volta das 18h08 e Ednardo já está autografando livros para Deus e o mundo, com um sorriso no rosto, a serenidade, a gentileza e a alegria de quem compartilha o melhor de si com as pessoas que foram ali prestigiá-lo. Não há música no ambiente, mas quase consigo ouvi-lo cantar: “Trago a vida incandescente/Com o brilho de quem sente, nosso momento aqui ...”. 

Ednardo é reconhecido nacionalmente como cantor e compositor, tendo produzido canções que são antológicas e indispensáveis não apenas para a Música Popular Brasileira, mas também para a compreensão da formação sociopolítica e cultural do país, ou seja, não se pode falar de cultura brasileira sem falar em Ednardo. Mas Ednardo não cabe “apenas” nos conceitos de cantor e compositor, pois é, na verdade, um multiartista, que transita pela literatura, artes plásticas e cinema. A belíssima foto da capa da referida biografia é de autoria de Eder Bicudo, enquanto o jornalista Luã Diógenes é o responsável pela pesquisa, narrativa, coordenação editorial e apresentação da obra. O prefácio, por sua vez, ficou a critério do pesquisador de Música Popular Brasileira, Wagner Castro. 

A biografia de Ednardo está organizada em 18 partes, sendo a maioria delas nomeadas com versos das suas canções. Uma parte da obra denominada de “As musas e as artes” (p.160-169) é dedicada, obviamente, às mulheres que em algum momento inspiraram a criatividade do artista, sejam elas “reconhecidas e declaradas, outras anônimas, ocultas ou coletivas...”. Ednardo: Papel, Pele & Pulso dedica uma parte, denominada de “Tua boca papoula enfebrecida” (p.170-179), aos poemas e pinturas eróticas produzidas pelo artista, raramente disponibilizadas ao público.

A obra em questão traça o percurso da carreira de Ednardo desde sua infância até os dias de hoje, servindo de deleite para aqueles que admiram seu trabalho e estão, como este que vos escreve, atentos a tudo aquilo que ele produz, assim como fonte de pesquisa para os estudiosos da música brasileira, que encontrarão nesse livro um manancial de informações, como a Discografia do artista (p.214-230) disponibilizada na última parte da obra. Assim, no ano em que faz 80 anos, é Ednardo quem nos presenteia com um trabalho rico, raro e sagrado como o pão que colocamos na boca e que nos cura.

Em tempo: Ednardo concedeu entrevista ao jornalista Joaquim de Carvalho, do Brasil/TV 247. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=fBYO-0j0cXQ